Por: Gladis Berlato
Os empresários brasileiros com negócios no Canadá interessados em estabelecer relações comerciais com aquele país demonstram otimismo com as oportunidades disponíveis neste que é o décimo maior destino das exportações brasileiras. Pelo menos é o que mostra a pesquisa realizada durante o 2º Fórum Econômico da Câmara de Comércio Brasil-Canadá: 89% acreditam que a conclusão do Acordo de Livre Comércio entre o Mercosul e o Canadá vai influenciar seus negócios, 51% estão animados com a conclusão das negociações e 38% acham que o acordo não deverá sair do papel nos próximos anos.
O Mapa de Oportunidades para as Exportações Brasileiras, elaborado pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), indica chances de exportações para o Canadá em 569 produtos.
Enquanto isso, os embarques se mantêm. Neste primeiro semestre, a corrente de comércio foi de US$ 4,135 milhões (FOB), contra US$ 4,346 milhões de igual período de 2023. O volume menor de negócios (importações e exportações) se deve à redução de compras de adubos, máquinas agrícolas, instrumentos de medição e de telecomunicações e de níquel, além de produtos semiacabados. Em 2023, o total de transações foi de US$ 9,1 bilhões, ocasião em que o Brasil bateu o recorde histórico de exportações ao Canadá com US$ 5,7 bilhões deste total. A expectativa é de ampliar a pauta exportadora de commodities e também de manufaturados, principalmente para o setor aeronáutico e de alta tecnologia, instrumento necessário para o setor da aviação.
Obstáculo utópico
O presidente do Conselho de Administração da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), Arthur Pimentel, garante que há interesse da indústria brasileira em incrementar as exportações e fortalecer a parceria comercial com o Canadá. E vê na finalização do Acordo Mercosul-Canadá um forte incentivo nessa relação comercial com geração de milhares de postos de trabalho vinculados aos negócios externos. A seu ver, há um grande universo de oportunidades entre Brasil e Canadá, tanto do lado das exportações de bens e de serviços, com foco nos diversos acordos do Canadá com outros países, quanto nas possibilidades de interesse dos americanos em investimentos, fusões e aquisições de empresas de diversos setores econômicos brasileiros.
Pimentel diz que apesar da diversificação das trocas comerciais, do volume de investimentos e dos interesses recíprocos de empresas canadenses e brasileiras em áreas como mineração, agricultura, energia, óleo e gás, inovação e tecnologia entre outros, há um grande paradoxo que parece inibir o avanço. “O obstáculo utópico chama-se Estados Unidos, parceiro dos dois países em vários setores, mas que, de forma obscura, parece neutralizar esforços e reduzir potencialidades de negócios como uma espécie de entidade desconhecida, inibindo movimentos comerciais”, explica.
O que fazer, então, para ampliar a pauta? O Canadá já fez seu dever de casa. Montou uma rede de acordos bilaterais de comércio para propiciar melhor estratégia para as transações externas. “Os acordos de livre comércio com outros mercados podem ajudar o Brasil, que precisa agir com estratégia para incrementar sua participação no comércio mundial”, contrapõe o presidente da AEB. Ele explica que se uma empresa brasileira deseja vender para determinado mercado deve estudar previamente se esse país, por acaso, integra algum acordo bilateral no qual o Canadá é parte interessada. Ele entende que se usar os EUA como plataforma para alcançar outro país onde o Canadá já costuma exportar com condições comerciais diferenciadas, o Brasil terá mais sucesso.
Mais manufaturados
Diplomata com mais de 20 anos de experiência, Mario Scangarelli, CEO da Câmara de Comércio, Indústria e Serviços do Brasil (Cisbra) e da Câmara de Comércio e Indústria do Rio de Janeiro (Caerj),entende que a relação Brasil-Canadá ainda está mais concentrada em commodities como alimentos, mineração e siderurgia e precisa avançar mais em manufaturados. Ele aponta a aviação como o grande destaque,já que ambos os países possuem duas fabricantes de aviões do mundo, intensificando a necessidade de fornecimento para essa cadeia aeronáutica. Citou como positivos outros itens já negociados como motores elétricos trifásicos superiores a 750W, pneus, motores para aviação, pás carregadoras e transformadores elétricos.
“O principal obstáculo é a competividade do produto nacional com os países vizinhos ao Canadá, Estados Unidos e México que oferecem condições logísticas e tributárias favoráveis”, afirma, lembrando que o Brasil e o Mercosul não são competitivos. Ele vai além e diz que “não há prioridade para o Brasil em explorar os potenciais nessa relação com os canadenses que acabam por buscar uma relação comercial com os países do bloco USMCA, que entrou em vigor em 2019, atualizando as condições do antigo NAFTA”.
Integração bilateral
O diretor comercial da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CCBC), Hilton Reche Nascimento, tambémenxerga um forte potencial a ser explorado entre os países e lembra que em 2022 foi registrada a maior corrente comercial entre os países (US$10,5 bi), superada em 2023. Ele aponta os setores minerais canadense e brasileiro, que buscam minerais estratégicos para viabilizar a transição energética, como um ponto de forte integração bilateral. Ele acrescenta, ainda, áreas como biotecnologia, energias renováveis e educação, que mostram um potencial de desenvolvimento de parcerias aproveitando as forças brasileiras e canadenses para gerar um resultado favorável mútuo.
Apesar de o Canadá ser um dos países com a economia mais aberta ao comércio internacional, ainda não possui um Acordo de Livre Comércio com o Brasil, o que removeria grande parte das barreiras tarifárias. “As negociações retomaram de forma oficial em 2023 e outros atores da sociedade também agem para ajudar a superar as barreiras em torno das dificuldades enfrentadas pelas empresas ao se internacionalizarem”, observa.
À propósito, a CCBC atua no auxílio às empresas brasileiras e canadenses no seu plano de negócios bilateral, possuindo também um plano completo de soft-landing nos dois países, o Brasil Hub para empresas brasileiras no Canadá, e o Canada Hub para empresas canadenses no Brasil.
Economia azul e energia verde
O sócio da APSV Advogados, Igor Maia Gonçalves, especialista no mercado de energia e investimentos estrangeiros, vê possibilidade de estreitamento das relações bilaterais com o Canadá para muito além de produtos exportáveis. “Temos a oportunidade de vender um ambiente propício ao desenvolvimento de projetos que tem um apelo sustentável, devido a diversos atributos que temos no Brasil. E, por outro lado, temos a chance de interagir com o mercado consumidor, com uma sociedade que já tem um outro nível de refinamento sobre essas questões de sustentabilidade”.
O tema vem sendo debatido por ele também como presidente da Câmara Setorial de Comercio Exterior e Investimento Estrangeiro da Agência de Desenvolvimento Econômico do Ceará junto à CCBC. A seu ver, o Brasil, em especial o Ceará, está num momento muito favorável para promover esta aproximação, considerando o protagonismo e o alinhamento brasileiros em energias renováveis e em hidrogênio verde. “Isso abre janelas de oportunidade para trabalhar em várias frentes dentro dessa perspectiva de criar vínculos e conexões com o Canadá nessas mesmas pastas”, afirma. E lembra que o Canadá tem um ambiente acadêmico muito pujante, da mesma forma que há uma comunidade brasileira no Canadá vinculada a atividades de ensino e academia. “A conexão através da educação, sem dúvida, é um ponto de destaque”, afirma. Além disso, Igor Gonçalves também aposta no avanço de tratativas que envolvem a economia azul.
Ceará na pauta com combustíveis e frutas
No contexto de fortalecimento da parceria entre Brasil e Canadá que também avançam as exportações cearenses com aumento de 18% no primeiro semestre, totalizando US$ 7,8 milhões. A performance foi liderada pelo setor de combustíveis, com 32% do total embarcado, somando US$ 2,5 milhões, e pelas frutas, com US$ 1,3 milhão, mantendo-se entre os principais produtos cearenses exportados, apesar de uma queda de 62% nos envios no período.
“A estratégia do Canadá é de aumentar as exportações em 50% até 2025, apoiando empresas com potencial exportador, especialmente PMEs, e incentivando a participação das mulheres no comércio internacional”, alerta Ana Karina Frota, gerente do Centro Internacional de Negócios da Federação das Indústrias do Ceará (CIN-FIEC). Ela ressalta que o país expandiu sua rede de acordos comerciais, 14 dos quais em vigor, e 10 implementados na última década. Ela torce para que o acordo de livre comércio com o Brasil avance nas negociações, o que impactará positivamente na competitividade brasileira e no comércio bilateral. “Apesar das tarifas médias baixas, alguns setores no Canadá têm picos tarifários”, ilustra.
Com a palavra, Irwana Albuquerque, secretária do Turismo do Ceará:
“O Canadá tem desempenhado papel fundamental na dinamização do turismo no Estado, não apenas como fonte emissora de turistas, que a cada ano cresce, principalmente por conta da prática do kitesurf, como também com investimentos, além da parceira no desenvolvimento de um setor mais moderno, eficiente e acolhedor, que torna o Ceará um destino turístico de destaque, beneficiando toda a cadeia produtiva associada ao turismo.”